Incêndios e desgoverno ameaçam parque de Pituaçu

22/02/2019

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Por Carolina Lisboa 

Um incêndio causado por uma obra de limpeza de terreno no último dia 15 de janeiro no entorno do Parque Metropolitano de Pituaçu, em Salvador, vem expondo um imbróglio ambiental. O Parque é fonte de lazer e turismo para a capital e abriga um dos principais remanescentes de Mata Atlântica da cidade, contendo inúmeras espécies ameaçadas de extinção como a preguiça-de-coleira (Bradypus torquatus), o ouriço-preto (Chaetomys subspinosus) e a anfisbena (Leposternon octostegum). A área sempre esteve sob forte pressão imobiliária e ambientalistas denunciam que não é a primeira vez que é incendiada, possivelmente de forma criminosa.

Incêndios

O último incêndio foi causado pela queimada do material vegetal suprimido, resultante de uma obra de limpeza do terreno, pertencente à empresa Al-Teix Patrimonial Ltda., ligada à incorporadora Delta. Contudo, a ação acabou afetando uma grande área, se prolongando por toda a noite e madrugada do dia 16 de janeiro e assustando moradores da comunidade vizinha do Bate Facho, no bairro Imbuí. Alguns moradores até saíram de suas casas com medo do fogo, que também pôs fim a um campo de futebol utilizado pela comunidade e por um projeto social que atendia cerca de 100 crianças. Um outro incêndio já havia atingido o Parque em setembro de 2011, mas foi rapidamente contido.

“O incêndio é criminoso, e foram dois, esse último de maior envergadura. A legislação ambiental não admite uso do fogo para limpeza de área. Eles poderiam retirar a vegetação e até vender o material, mas não queimar. Colocaram os moradores em perigo”, concluiu Marcele do Valle, conselheira do Parque de Pituaçu.

O fogo não afetou somente os moradores, mas também a biodiversidade local. Moacir Tinôco, professor coordenador do Centro de Ecologia e Conservação Animal (ECOA) da Universidade Católica e Salvador (UCSal), membro do IUCN – Species Survival Commission/SSC e parceiro internacional do Amphibian Ark/IUCN, concorda que a queimada foi irregular: “Ambas, vegetação e fauna, tanto da área privada quanto do Parque, foram afetadas. Independentemente da licitude do processo, a supressão de vegetação foi feita de maneira irregular, sem qualquer ação de resgate de fauna”, ponderou ele.

Batalha judicial

A Secretaria Municipal de Desenvolvimento e Urbanismo de Salvador (Sedur) concedeu o alvará de supressão de vegetação do terreno em 08 de agosto de 2017. Em dezembro de 2018, ambientalistas e o Ministério Público da Bahia (MP-BA) ajuizaram uma ação contra o Município de Salvador e a Al Teix no Tribunal de Justiça da Bahia (TJ-BA), quando foi expedida uma liminar que suspendeu a supressão de vegetação e proibiu o desmatamento no terreno, pois quando a autorização foi concedida pela Sedur, em 2017, o espaço ainda não tinha sido alvo do decreto que redefiniu os limites do Parque. Na ação, a promotora Hortênsia Pinho argumenta que a autorização é nula, pois a competência de licenciamento seria do Instituto do Meio e Recursos Hídricos (Inema) e não poderia ter sido concedida sem a anuência do Ibama. A liminar foi derrubada no dia 5 de janeiro de 2018, após uma batalha judicial entre os proprietários do terreno, o Ministério Público do Estado (MP-BA) e o Grupo Ambientalista da Bahia (Gambá), dando a Al-Teix Patrimonial Ltda. o direito de avançar com a obra.

Desmembramento

poligonais

Recentemente, em 01 novembro em 2018, o terreno em questão foi desmembrado do Parque Metropolitano de Pituaçu via decreto 18.679/2018, assinado pelo governador Rui Costa. O decreto altera os limites definidos no decreto nº 14.480, de 16 de maio de 2013, excluindo do Parque o terreno particular. Segundo o MP-BA, um documento oficial do próprio Governo do Estado da Bahia atesta que essa manobra resultou no desmatamento de área de Mata Atlântica em estágio médio de regeneração e supressão de Área de Preservação Permanente (APP) em três recursos hídricos na área. Esta foi a terceira vez que os limites do Parque foram modificados por decreto estadual.

Marcele do Valle acredita que o decreto é ilegal e que houve omissão do Governo: “o terreno em questão tem cerca de 400 mil m², mas já foram desmatados cerca de 12 hectares, uma área equivalente ao tamanho de 12 campos de futebol. Acionamos a justiça questionando o decreto porque ele é ilegal. Esse tipo de separação precisa acontecer através de lei. Além disso, ainda que o terreno seja particular, caberia ao governo fazer a desapropriação e manter a área sob proteção ambiental. O conselho gestor do Parque sequer foi consultado sobre a alteração”, concluiu.

Pressão imobiliária

De acordo com o MP-BA, o Parque Metropolitano de Pituaçu e seu entorno (área de amortecimento) vêm sofrendo diversas investidas do mercado imobiliário devido à sua localização, em região nobre da cidade com vista para o mar e próximo à praia, onde o metro quadrado tem um valor médio de R$ 5.500,00. Por isso, os limites do Parque de Pituaçu foram alterados três vezes, de 2012 a 2018, por decreto estadual, comprometendo sua segurança jurídica e afrontando a Constituição Federal que exige que o procedimento seja feito por meio de lei.

Em dezembro, a promotora do MP-BA Hortênsia Pinho ajuizou uma ação civil pública contra o Estado, solicitando a suspensão de decretos estaduais que reduziram a área do Parque. Conforme a ação, os decretos 10.182/2006, 14.480/2013 e, mais recentemente, o 18.679/2018 “reduziram significativamente a poligonal do Parque em afronta à Constituição Federal, por se tratar de espaço territorial especialmente protegido nos termos do artigo 225, parágrafo 1º, inciso III, da Carta Magna, por força do qual eventuais reduções só poderiam se dar mediante edição de lei”.

Audiência pública

No dia 12 de fevereiro de 2019 houve uma audiência pública para discutir a situação do Parque de Pituaçu. A audiência foi convocada pelo Ministério Público Estadual, por meio da promotora de justiça Hortênsia Pinho, e aconteceu na sede do Ministério Público, em Salvador.

Durante a audiência, a equipe técnica do MP apresentou o quadro evolutivo de degradação do Parque desde 2010, com estudos georreferenciados. A pauta da audiência também abrangeu relato de representantes da sociedade sobre as preocupações urbanísticas, ambientais e sociais em relação ao Parque; a apresentação das providências adotadas pelo Governo do Estado para aperfeiçoar a fiscalização e realizar a regularização fundiária das comunidades do Bate Facho e Ilha do São João; a apresentação, pelo Município, do projeto licenciado para o loteamento da empresa Al Teix Patrimonial Ltda. com informações sobre a localização da supressão da vegetação e; a apresentação das provas técnicas georreferenciadas. 

Sobre o Parque

O Parque Metropolitano de Pituaçu está localizado no bairro de Pituaçu, em Salvador, próximo à orla e à Universidade Católica do Salvador (UCSal). Foi criado por decreto estadual nº 23.666 de 4 de setembro de 1973 e pelo decreto nº 23.113 de 12 de abril de 1978 foi declarada a utilidade pública do terreno para desapropriações, inicialmente com 660 hectares, e hoje com 392,10 hectares.

Logomarca Gambá

Av. Juracy Magalhães Jr, 768, Edf. RV Center, sala 102, Rio Vermelho, Salvador/Ba. Tel/fax: 71- 3346-5965

Reserva Jequitibá – Posto Avançado da Reserva da Biosfera da Mata Atlântica, Serra da Jibóia, Elísio Medrado/BA