Comunidades rejeitam projeto de concessão do Parque Sete Passagens e vão ao Ministério Público

14/02/2022

Parque Estadual das Sete Passagens. Foto: Rogério dos Santos Teixeira

Foi encerrada neste dia 7 a consulta pública sobre o projeto de concessão de três parques baianos à iniciativa privada, levado a cabo pelo Governo do Estado e Governo Federal, através do BNDES. A participação da sociedade aconteceu somente através do envio de formulários com sugestões para o processo de licitação de serviços de apoio à visitação de atrativos e instalações do Parque Zoobotânico (Salvador), e dos Parques Estaduais do Conduru (Ilhéus) e Sete Passagens (Miguel Calmon). A questão sobre a pertinência da concessão em si, no entanto, nunca foi colocada nas consultas públicas que pedem somente sugestões aos projetos já formatados.

Desde o anúncio da iniciativa, em fevereiro de 2021, inúmeros movimentos sociais têm se colocado contra a concessão – que enxergam como uma privatização dos parques – em manifestações presenciais e virtuais. Em janeiro mais de 20 entidades, incluindo o Gamb´á, assinaram documento em defesa do parque e contra a concessão.

“Esse processo começa por onde? Houve uma avaliação de impacto ambiental para entender se um projeto dessa natureza é possível de ser realizado em uma unidade de conservação de proteção integral que foi criada para a proteção de recursos hídricos? A pergunta que está na consulta é sobre o processo de licitação, que deveria ser posterior a uma decisão coletiva de colocar em prática ou não esse projeto”, aponta Gabriella Barbosa Santos, professora de direito e moradora do entorno do Parque Estadual de Sete Passagens. A concessão do PESP é a que tem gerado maior controvérsia e mobilização social.  Treze entidades de Miguel Calmon e Jacobina entre associações comunitárias, de produtores rurais, quilombolas e de proteção ambiental representaram ao Ministério Público pedindo a suspensão do projeto de concessão. 

O promotor Pablo Almeida, do Ministério Público da Bahia, fez críticas ao projeto durante a audiência pública promovida pela Frente Parlamentar Ambientalista da Bahia, no último dia 3. Segundo ele, o processo apresenta falhas graves tanto na forma de sua execução quanto no seu conteúdo, além de não ter sua pertinência comprovada. “O projeto traz consigo a ideia de que só existem benefícios econômicos à região e à unidade de conservação. Como se não existissem prejuízos, que ocorrem em todo tipo de atividade econômica. Mas qual vai ser o incremento em relação à política pública de saúde com o aumento de 100% da visitação no parque? A estrutura do município com esse acréscimo de turismo vai atender também a esses visitantes em detrimento dos moradores?”, questionou o promotor em relação a aspectos não abordados pelo projeto.

Para Gabriella, o projeto de concessão dos serviços de visitação do Parque Estadual de Sete Passagens é ilegal pois seria incompatível com o objetivo expresso no decreto de criação do Parque. Trata-se de uma unidade de conservação de proteção integral criada com objetivo de “preservar os recursos hídricos das áreas das Serras do Campo Limpo, da Sapucaia, e da Jaqueira localizadas no polígono das secas, assim como proteger as nascentes que suprem o Rio Itapicuru Mirim, de grande relevância para a Bacia Hidrográfica do Rio Itapicuru, garantindo o abastecimento d´água para a população local e para as atividades agropecuárias”. A concessão, no entanto, está voltada a duplicar a recepção de turistas e não prevê nenhum tipo de ação para a conservação das suas águas.

Falta consulta e participação popular

Audiência Popular promovida pelos movimentos sociais. Todos os presentes se colocaram contra a concessão (Foto: Saulo Côrte)

Na última semana de janeiro a Secretaria de Meio Ambiente do Governo do Estado realizou 3 eventos virtuais que foram chamados de audiências públicas, mas que dificilmente poderiam ser consideradas como tal por conta da metodologia não-participativa. Foram transmissões online – uma sobre cada parque sob consulta – realizadas pelo canal da SEMA no youtube, sem possibilidade de fala, nem de comentários por escrito do público. A única forma de participação disponibilizada foi o envio de perguntas através de formulário.

“O MP-BA não poderia deixar de tecer críticas às audiências públicas em que houve a desabilitação expressa dos comentários no youtube, para evitar as manifestações das pessoas, o que não era um padrão das transmissões realizadas pela Secretaria de Meio Ambiente. Foi uma mudança de postura para dolosamente silenciar as críticas ao projeto na opinião do MP. Isso mostra que a intenção nunca foi discutir efetivamente o projeto. E ao invés de uma discussão ambiental, parecia uma apresentação de projetos para acionistas e interessados em investimentos econômicos”. O promotor aponta ainda que existe uma portaria do INEMA estabelecendo normatização para as audiências públicas realizadas por empreendimentos de forma a garantir a efetiva participação social. No entanto estas normas não foram seguidas na apresentação sobre as concessões.

Mais grave ainda é a falta de consulta às comunidades tradicionais que serão afetadas pela decisão de conceder o parque à iniciativa privada, conforme manda a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho, da qual o Brasil é signatário. Em Miguel Calmon são reconhecidas e certificadas pela Fundação Palmares as comunidades quilombolas de Saco, Covas e Mucambo dos Negros. Em Jacobina, as comunidades do Campestre, Corea, Bananeira, Lázaro de Timbó, Baraúnas de Dentro e Malhadinha de Dentro.

Ao longo de todo o ano de 2021 a empresa responsável pela realização dos estudos se comprometeu a realizar oficinas nas comunidades do entorno para que estas fossem devidamente informadas. No entanto, isso não aconteceu e o governo do estado tem atribuído essa responsabilidade ao Conselho Gestor do parque.

Modelo de Concessão

A concessão proposta pelo BNDES inclui a exploração dos serviços de visitação por 30 anos. Para tanto a concessionária que for escolhida através de processo licitatório deve realizar obrigatoriamente um investimento de R$4,3 milhões em uma série de estruturas como estacionamento, centro de visitantes, trilhas, restaurante, estruturas de hospedagem, entre outros. A previsão do estudo é que o número anual de visitantes passe de 20 mil para 45 mil, gerando um lucro de R$92 milhões ao longo de todo o período.

A exploração de receitas não previstas no plano inicial poderá acontecer se for autorizada pelo Inema. Não foi apresentado nenhum investimento que melhore a disponibilidade hídrica no parque, principal justificativa da existência da unidade de conservação.

Parques de Salvador

O projeto dos governos federal e estadual inclui também a concessão dos Parques de Pituaçu e São Bartolomeu, em Salvador. Segundo a Sema e Inema, os estudos de modelo de negócios dessas unidades de conservação não estão prontos, motivo pelo qual ainda não houve a consulta pública sobre estas concessões.

No entanto, não é necessário consulta para saber que as comunidades de ambos os parques têm rechaçado a ideia de concessão para a iniciativa privada. A comunidade em torno do Parque de Pituaçu tem realizado campanha nas redes sociais contra a iniciativa. Os defensores do Parque São Bartolomeu também têm realizado intensas mobilizações que têm agregado ambientalistas, povo de santo e associações comunitárias do subúrbio de Salvador. 

Logomarca Gambá

Av. Juracy Magalhães Jr, 768, Edf. RV Center, sala 102, Rio Vermelho, Salvador/Ba. Tel/fax: 71- 3346-5965

Reserva Jequitibá – Posto Avançado da Reserva da Biosfera da Mata Atlântica, Serra da Jibóia, Elísio Medrado/BA