27/05/2023
Quando decidiu fazer o seu mestrado no Jardim Botânico do Rio de Janeiro sobre o gênero botânico Senna, conhecido popularmente como São João, o biólogo Alexandre Gibau não imaginava ainda que sua pesquisa o levaria até a Serra da Jibóia, um remanescente de Mata Atlântica no Recôncavo Sul Baiano. Mas veio de lá o exemplar da planta – conservada na forma de exsicata – que ele descreveu pela primeira vez para a ciência e batizou de Senna bahiensis. A espécie, tão nova para a ciência, já encontra-se ameaçada de extinção e o único lugar onde pode ser encontrada é na Serra da Jiboia. A partir deste importante achado botânico, nesta sexta-feira (26), véspera do Dia da Mata Atlântica, o Gambá apresentou ao Secretário e ao Conselho Estadual de Meio Ambiente um documento reforçando o pedido de criação de Unidades de Conservação no local e recebeu do secretário Eduardo Martins Sodré o compromisso de avançar nesta agenda. Ótima notícia para a Serra da Jiboia!
A descoberta da Senna bahiensis foi relatada em artigo de 2021. Alexandre desconfiou que alguns exemplares disponíveis em herbários e classificados como sendo da espécie Senna gardneri, nativa de áreas de Caatinga, na verdade poderiam ser uma espécie nova pois os registros indicavam ocorrência em áreas mais úmidas, de Mata Atlântica. Ele estava certo. Os estudos morfológicos e análise do padrão de nervação das folhas mostrou que se tratava de uma espécie ainda não descrita. No final de 2022, o Centro Nacional de Conservação da Flora realizou avaliação do seu status de conservação e chegou ao alarmante resultado de que a espécie está criticamente em perigo e que a Serra da Jibóia é o único lugar onde sua presença foi encontrada até o momento. Ou seja, trata-se de uma espécie endêmica da área.
Alexandre Gibau explica no documento entregue ao secretário que a categoria “Criticamente em Perigo (CR)” é considerado o maior grau de ameaça que uma espécie pode receber antes da sua extinção. “Entre os motivos dessa classificação, pode-se citar a raridade e declínio populacional da espécie, e a ausência de unidade de conservação que proteja a espécie na serra da Jibóia. Dessa forma, a criação de unidades de conservação dentro da serra da Jibóia é urgente para a conservação da Senna bahiensis, mas também para a conservação da sua excepcional biodiversidade, com muitas espécies raras e endêmicas”, defende.
Além da Senna bahiensis, em 2017 foi descoberta uma espécie de peixe inédita para a ciência, o Aspidoras kiriri. E o levantamento bibliográfico realizado por equipe interdisciplinar da UFRB em 2015 mostra que, à época, havia registros de 25 espécies descobertas na área. Por conta dessa enorme biodiversidade – parte ainda desconhecida – a região aparece como prioritária para conservação no levantamento conduzido pela Secretaria de Meio Ambiente e WWF.
Já existem também estudos conduzidos pelo Gambá e UFRB que apontam para a necessidade de se criar um mosaico combinando UCs de uso sustentável e de proteção integral para que a floresta seja conservada. Ainda há necessidade de estudos complementares para a questão fundiária, o que deve avançar agora com o compromisso da Secretaria Estadual de Meio Ambiente.
A proposta de criação tem tido forte adesão das comunidades e poderes públicos locais. Em 2020, as prefeituras de Castro Alves, Elísio Medrado, Santa Teresinha, São Miguel das Matas e Varzedo, que englobam a serra, chegaram a assinar uma carta de intenções manifestando apoio à iniciativa.
O único local onde foram encontradas populações da Senna bahiensis, o Morro da Pioneira é uma das áreas mais ricas em biodiversidade da Serra. Infelizmente, ela é constantemente atingida por queimadas e não conta com as estruturas de prevenção e combate a incêndios que são disponibilizadas para Unidades de Conservação. Além da proteção à biodiversidade, os benefícios da conservação devem causar impactos positivos aos municípios, com um importante potencial de exploração do turismo ecológico. A manutenção da Mata Atlântica em pé garante também a continuidade de serviços ambientais essenciais à população, como a provisão de água e polinização.
O professor Armando Nascimento Filho, morador de Castro Alves, defende providências rápidas. “Acreditamos que a criação de unidades de conservação aqui é de extrema importância e urgência para todas as comunidades do entorno da Serra, nos cinco municípios. Para que elas vivam de maneira sustentável, preservando o patrimônio natural que temos aqui, que tem grande importância ecológica e socioeconômica também. É uma luta de muito tempo, tanto da sociedade civil organizada quanto das comunidades”. Neste dia da Mata Atlântica o compromisso do Governo do Estado com a proteção da Serra da Jiboia, se concretizado, será um belo presente para o bioma.