Gambá e Cospe vão a campo com o projeto Resiliências Climáticas

27/04/2022

Imagem: arquivo pessoal.

No final de 2021 , Gambá e Cospe deram início ao projeto “Resiliências Climáticas: boas práticas de adaptação à mudança do clima em áreas costeiras e nos biomas Mata Atlântica, Cerrado e Caatinga baianos”. Este é um projeto de âmbito internacional, apoiado pela União Europeia, com duração prevista de 3 anos. A ONG italiana COSPE e o Gambá compartilham, neste projeto, o objetivo comum de promover desenvolvimento equitativo, sustentável e inclusivo no Brasil, conforme compromissos ratificados pelo Congresso Nacional em 2016, na assinatura do Acordo de Paris e reafirmado em 2021 na COP26. 

Após 6 meses de planejamento e articulações político-sociais, o projeto foi formalmente apresentado pela equipe técnica a comunidades, associações, sindicatos e secretarias municipais do entorno da Serra da Jibóia, Morro do Chapéu, Bacia do Rio de Janeiro e Baía do Iguape. Cada uma dessas regiões representa um dos biomas englobados pelo projeto: mata atlântica, caatinga, cerrado e zona costeira, respectivamente. O momento é de entender quais desafios estão sendo vividos e soluções pensadas pelos povos originários e tradicionais nestes locais perante os impactos da mudança climática, e que possam vir a ser reconhecidas como boas práticas de adaptação e resiliência das comunidades. 

O projeto pretende também obter maior eficácia das ações de incidência política da Rede Convergência pelo Clima;  propor, implementar, monitorar e avaliar políticas públicas para mitigação e adaptação às mudanças climáticas no Estado da Bahia e ampliar a representatividade dos povos vulnerabilizados pelos impactos das mudanças climáticas. Tal objetivo surge a partir da reativação, em 2020, do Fórum Baiano de Mudanças Climáticas e de Biodiversidade, responsável pela revisão da Política Estadual sobre Mudança do Clima na Bahia. Porém, a participação da sociedade civil e representatividade dos territórios nesta construção política é baixa.

Entendendo a crise climática

As alterações climáticas na Terra sempre existiram. Se o Planeta sempre viveu tais variações , porque fala-se tanto nos riscos das atual crise climática? As mudanças climáticas, atualmente, tornam-se uma preocupação devido ao ritmo de aumento da temperatura global, que tem sido muito mais acelerado, quando comparado a outras eras. A consequência é a dificuldade da adaptação humana ao aumento da temperatura.

Estima-se que a ação humana já tenha elevado a temperatura da Terra em, aproximadamente, 1,2ºC desde o período pré-industrial. E, de acordo com o relatório do Sexto Ciclo de Avaliação do IPCC (Painel Intergovernamental sobre Mudanças pelo Clima), organizado pela ONU e publicado em fevereiro de 2022,  estamos caminhando para um aumento de 1,5ºC na temperatura planetária, já com impactos irreversíveis para a adaptação humana e ambiental. Este aumento está previsto em curto prazo, até 2040. A imagem abaixo, retirada do relatório, mostra a aceleração e a projeção prevista para 2100 em 5 diferentes cenários de emissão de carbono. 

Imagem: Aumento da temperatura global relativa ao período entre 1850 e 1900, com projeção até o ano 2100.
Fonte: IPCC – AR6 – Sixth Assement Report of the Intergovernmental Panel on Climate Change

Desde 1900, principalmente pós 1945 (quando a primeira bomba atômica foi detonada), o aumento da temperatura global se acentuou intensamente. Este período, associado à aceleração industrial, é apontado como o período em que as mudanças climáticas tornam-se um risco para os sistemas naturais e humanos. Em aproximadamente 50 anos, a Terra aqueceu de modo incomparável ao período anterior à industrialização, tornando-se um risco real à existência humana. Alguns autores identificam essa dimensão temporal como Antropoceno, uma era geológica marcada pela ação humana. 

Ao mensurar os impactos e riscos das mudanças climáticas, o IPCC considera também tendências globais não climáticas que agravam o cenário. Aqui, incluem-se consumo insustentável de recursos naturais, rápida urbanização, desigualdades sociais e econômicas a pandemia, entre outros. Deste modo, as evidências científicas apontam para o ser humano como indutor das atuais mudanças planetárias. A análise de causas e impactos nas mudanças climáticas, elaborado pelo IPCC, demonstra que o risco climático surge da sobreposição da vulnerabilidade e exposição gerada pelo sistema humano em relação aos perigos climáticos. 

Imagem: De riscos climáticos ao desenvolvimento resiliente ao clima.
Fonte: IPCC – AR6 – Sixth Assement Report of the Intergovernmental Panel on Climate Change

Mas nem tudo são más notícias. Ao analisar as possíveis soluções para a emergência climática, o relatório de 2022 aponta que se o ser humano, em sociedade, pode provocar mudanças climáticas e se adaptar dentro de certo limite, ele pode também restaurar ecossistemas e conservá-los para o desenvolvimento resiliente ao clima. Neste âmbito, a atuação do projeto Resiliências Climáticas dará voz aos povos tradicionais e, normalmente, mais vulnerabilizados pelos impactos das mudanças climáticas,  ao provocar maior eficácia das ações de incidência política realizadas por parte das OSCs da Rede Convergência pelo Clima.

O Acordo de Paris, a COP 26 e o retrocesso Brasileiro

A atenção às mudanças globais não é uma novidade. Pelo contrário, a luz de alerta já está acesa faz algum tempo e o Brasil tem apresentado aparente comprometimento, ainda que a realidade se distancie dos acordos pactuados. Em linhas gerais, o Brasil participou dos seguintes acordos:

  • Em 1987, no relatório de Brundtland, Nosso Futuro Comum, destaca-se a reflexão sobre o que deixamos para as gerações futuras poderem suprir as suas próprias necessidades;
  • Em 1992, o Brasil recebe a RIO 92 e reforça a diretriz para o desenvolvimento sustentável;
  • Já em 1997, foi criado o protocolo de Kyoto, ratificado pelo Brasil em 2002, com o compromisso de reduzir as emissões de gases causadores do efeito estufa. 
  • Em 2015, o Brasil se compromete a alcançar as 197 metas das ODS propostas pela Agenda 2030, promovida pela Organização das Nações Unidas. 
  • Mais recentemente, em 2016, o país ratifica o acordo de Paris, “reconhecendo que as mudanças climáticas representam uma ameaça urgente e potencialmente irreversível para as sociedades humanas e para o planeta” (Acordo de Paris, 2015). 
  • Em 2021, o Brasil assinou o Pacto de Glasgow, decorrente da COP 26 , se comprometendo a zerar o desmatamento até 2030.

O acordo de Paris (COP21) recebe grande destaque na pauta climática por estabelecer orientações consideradas mais precisas e claras, em relação aos tratados anteriores. Nele, foram estabelecidas metas importantes para o alcance do desenvolvimento resiliente ao clima, conforme proposto pelo IPCC. As principais metas estabelecidas pelo acordo de Paris foram:

  • Revisão e renovação das metas e acordos climáticos a cada 5 anos, reforçando as ações regularmente, com avaliação das ações climáticas (Global Stocktake – balanço geral, e que incentivou o Pacto de Glasgow);
  • Direcionamento a um futuro sem emissão de carbono, adaptável, próspero e justo;
  • Investimentos para  reforçar a capacidade institucional e tecnológica de populações mais vulneráveis. Os países desenvolvidos concordaram em mobilizar US$ 100 bilhões por ano até 2025;
  • Compromisso no esforço significativo para manter o aumento da temperatura global abaixo de 1,5ºC.
  • Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs) em que cada país informa como participará do combate à mudança climática, com apresentação transparente e regular de seus relatórios;

O Pacto de Glasgow foi assinado em 2021 por 110 Países na COP 26, como decorrência da proposta de revisão contínua dos acordos. Apesar da expectativa de avanços, depois do adiamento de 20 meses da cúpula por conta da pandemia, a revisão apresentou resultados insatisfatórios e avanços limitados. Ainda assim, algumas metas importantes foram determinadas na Escócia:

  • objetivo de manter o aquecimento global a 1,5ºC;
  • aprovação do Artigo 6 do Acordo de Paris para regulação do mercado de carbono;
  • zerar o desmatamento ilegal até 2028 e o desmatamento amplo (sem identificações de legalidade) até 2030;
  • sugestão de uso de marcos temporais comuns aos países, para o acompanhamento da evolução das ações.

O Brasil, especificamente, comprometeu-se nas NDCs com:

  • redução de 50% das emissões de gases de efeito estufa até 2030 (mesma meta de 2015);
  • restaurar e reflorestar 18 milhões de hectares de florestas até 2030;
  • alcançar, ao menos, 45% de energias renováveis da matriz energética brasileira;
  • recuperar 30 milhões de hectares de pastagens degradadas;
  • aumento da malha ferroviária;

Um dos principais questionamentos quanto ao Pacto de Glasgow é a ausência de determinação para formas de alcançar os objetivos ou penalização para quem não alcançá-los, o que preocupa os ambientalistas. Também não foram apresentados debates ou posicionamentos diante do possível aumento de mais de 1,5ºC. O impacto das questões climáticas, associado a questões sociais e ambientais, fez com que o debate voltasse à tona associado ao tema do racismo ambiental.

Ao realizar o projeto Resiliências Climáticas, Cospe e Gamba contribuem para as mudanças necessárias a adaptação ao clima. Os 4 territórios de atuação foram escolhidos de modo a abranger a diversidade ambiental da Bahia, compreendendo os impactos das mudanças climáticas nos diversos biomas. As parcerias realizadas em cada um desses biomas buscam fortalecer as táticas de adaptação praticadas através de incidência política, a partir das diretrizes apontadas pelos Pactos internacionais.

Logomarca Gambá

Av. Juracy Magalhães Jr, 768, Edf. RV Center, sala 102, Rio Vermelho, Salvador/Ba. Tel/fax: 71- 3346-5965

Reserva Jequitibá – Posto Avançado da Reserva da Biosfera da Mata Atlântica, Serra da Jibóia, Elísio Medrado/BA