Projeto de Lei da Louos segue para votação em plenária sem estudos técnicos e com processo participativo questionado

04/08/2016

A Lei de Ordenamento e Uso e Ocupação do Solo de Salvador está sendo revista para regulamentar o recém aprovado Plando Diretor do município. O projeto de lei foi proposto pela prefeitura e relatado na câmara pelo vereador Leo Prates. Seu relatório apresentou 78 emendas no último sábado e foi aprovado nas comissões esta quinta-feira. Deve seguir para votação em plenária no dia 10. Instituições técnicas como o Conselho de Arquitetura e Urbanismo da Bahia (CAU-BA) e o Instituto de Arquitetos da Bahia (IAB-BA) não ficaram satisfeitas com o projeto.

Segundo Carl Von Hauenschild, do CAU-BA, a Louos tem o mesmo defeito do PDDU, a falta de estudos técnicos e conteúdo mínimo – a base técnica dos dois são do período entra 1999 e 2001. Ele afirma que o CAU-BA não apresentou propostas de emenda por entender que o projeto de lei não tem o mínimo necessário para regular a ocupação e uso do solo do município: “Se você regulamenta algo que não tem base técnica potencializa o problema ao invés de ordenar. Não é através de emendas que vai se resolver o problema que é de falta de base técnica”.

Carl cita a falta de estudos de densidade para definir a capacidade de suporte de cada área, ou seja, quantos moradores a infraestrutura local suporta. Quanto mais adensadas as construções, mais trânsito congestionado, mais lançamento de esgoto, pessoas usando os equipamentos públicos, entre outros fatores. “Precisa saber em que áreas você consegue adensar [ter mais moradores por m2] com custo zero, porque tem infraestrutura ociosa; e em que porção você não pode adensar por falta dessa estrutura”.

Na Louos, cerca de 40% do território foi classificado como Zona Predominantemente Residencial 3, que possui coeficiente de aproveitamento mínimo de 0,3 e máximo de 3. Isso quer dizer que em 40% do território de Salvador poderá se construir 3 vezes a área total de seu terreno. Segundo Carl, isso deve triplicar a capacidade construtiva do município, sendo que a população cresce cerca de 1,8% ao ano. Para ele, um terço dessa previsão de crescimento construtivo já seria suficiente para as necessidades da cidade nos próximos 10 anos.

Áreas verdes: Para além do Vale Encantado

Durante as discussões sobre a Louos houve uma grande mobilização e polêmica em torno do Parque do Vale Encantado, que aparece no PDDU e na Louos ameaçado pelo projeto da Avenida Atlântica. Além dele, o Parque Pituaçu seria prejudicado pois está previsto um viaduto sobre sua área. Os vereadores e a prefeitura afirmam que não há ainda estudos nem licenciamento para a avenida, mas ela encontra-se prevista no PDDU e na Louos, assim como a Linha Viva.

O Vale Encantado aparentemente conseguiu se salvar com a inclusão de um parágrafo no artigo 35 da Louos que determina que o traçado da Avenida do Atlântico não deve “invadir os limites da poligonal do Parque Ecológico do Vale Encantado e da Unidade de Conservação relativa ao Parque a ser instituída nos termos do PDDU”. Diante do impasse fundiário, já que há áreas públicas e privadas no parque, a Associação de Moradores do Alphaville se comprometeu a doar as terras privadas para a efetivação da UC. O processo de criação da UC será encaminhado agora pela Secretaria de Cidade Sustentável.

Outras reivindicações de mudança na Louos relativas à áreas verdes, no entanto, não tiveram a mesma sorte. As propostas de emendas que pediam a proibição de implantação de empreendimentos em Áreas de Proteção aos Recursos Naturais, o parcelamento do solo nas Zonas de Proteção Ambiental e a implantação de edificações em áreas verdes e de lazer (seja por entidades públicas ou privadas) não foram atendidas no relatório final. Com isso as áreas verdes de Salvador tornam-se menos restritivas quanto ao seu uso, aumentando sua vulnerabilidade.

Outra deficiência de estudos apontada por Carl Von Hauenschil é a falta do mapeamento de áreas não edificáveis de Salvador, a exemplo das Áreas de Preservação Permanente e a faixa de 60 metros a partir da linha máxima da preamar, protegidas respectivamente pela legislação federal e estadual. O estudo tornaria facilmente identificáveis as áreas onde não se pode construir. Caso existisse, o levantamento apontaria, por exemplo, que o Hospital Municipal de Salvador, cujas obras a prefeitura está iniciando, invade área não edificável de APP à beira da represa de Ipitanga.

Verticalização da Orla: Sombreamento e ventilação

Gabarito-de-altura_Borda-Atlântica

 

Outro retrocesso da Louos é a ampliação do horário permitido para o sombreamento nas praias a partir da verticalização da orla atlântica. No PDDU de 2008 não era permitido sombreamento entra as 8 e 16h; no PDDU e Louos recém aprovados a faixa foi diminuída para a das 9 às 15h. Embora a barreira inicial permitida no antigo PDDU fosse de 17 pavimentos, maior do que a primeira barreira prevista no escalonamento atual (12 andares), os estudos de sombreamento são mais permissivos quanto ao horário. Isso quer dizer que se um prédio, mesmo que com menos pavimentos do que o permitido, sombreasse a praia às 8h da manhã, sua construção não seria permitida antes e agora será.

Além do fato da verticalização sombrear as praias e modificar significativamente a paisagem da borda atlântica, outro grande problema que ela gera são as barreiras para ventilação. Dessa forma, a ventilação no miolo da cidade fica comprometida e são geradas ilhas de calor. Emenda propondo um mínimo de distanciamento entre as edificações e seus vizinhos não foi acatada, sendo considerada inviável pela comissão técnica da câmara.

A participação é efetiva?

O caráter técnico e a localização central das audiências não permitiu a participação da população leiga, isso se reflete nas propostas de emenda enviadas à câmara e disponíveis no site. A grande maioria, senão todas as propostas de emendas, ou são pertinentes à toda território ou concentram-se no eixo entre a paralela e a orla atlântica, o mais privilegiado da cidade. Esse é um indicativo de que a maioria da população de Salvador, residente nas áreas que mais necessitam de atenção e políticas urbanas específicas, a chamada Salvador informal compreendendo o eixo da BR-324, miolo e subúrbio ferroviário, não esteve envolvida no processo.

IMG_1299

Quinta audiência pública promovida pela câmara

Já entre os técnicos a queixa era da dificuldade em se fazer ouvir e gerar mudanças no projeto. Durante a quinta audiência pública na câmara, Solange Almeida (IAB-BA), e o presidente do CAU-BA, Raul Nobre, afirmaram que faltou participação das entidades no processo e pediram mais tempo para sanar os problemas do Projeto de Lei. Os técnicos envolvidos no processo de planejamento da cidade pela prefeitura são oriundos do setor privado e grandes especialistas em urbanismo, mobilidade e outras áreas pertinentes não foram consultados.

Os vereadores da oposição também se posicionam por mais tempo para a discussão do projeto, uma das críticas é que as audiências aconteceram no período de recesso da câmara. Em média estiveram presentes 9 vereadores em cada uma das audiências, sendo que foram 17 os edis votantes nas comissões e serão 43 na plenária. A vereadora Aladilce criticou também o fato do projeto tramitar de forma conjunta nas comissões de constituição e justiça, finanças, orçamento e fiscalização e planejamento urbano e meio ambiente, “faz-se comissão conjunta para estudo de uma matéria, não para elaboração e votação de parecer”.

Logomarca Gambá

Av. Juracy Magalhães Jr, 768, Edf. RV Center, sala 102, Rio Vermelho, Salvador/Ba. Tel/fax: 71- 3346-5965

Reserva Jequitibá – Posto Avançado da Reserva da Biosfera da Mata Atlântica, Serra da Jibóia, Elísio Medrado/BA